É impossível pensar num pai ou mãe que nunca tenha
pensado: “por meus filhos, eu faço tudo”. Isso, aliás, é visto como
um grande valor em nossa sociedade, sendo passível de fortes críticas o pai, terríveis
condenações a mãe, que emitirem qualquer sinal em contrário. Desligada,
negligente, incapaz, “isso não é mãe!”, todos se apressarão a dizer. Os mais
sensíveis percebem a existência, desde a concepção, do fantasma da incapacidade
que assombra pais e mães. Já na gravidez, vão colecionando conselhos, tais como
a indefectível bolinha de linha vermelha na testa para tirar soluço ou, antes
disso, o não chupar limão para que a criança não nasça com cara azeda.
Nas providências amenas do dia a dia, esse valor
realmente parece funcionar. Emaranhados na guerra de egos que embaralha o
trânsito, ambientes de trabalho, condomínios, relações conjugais – parecem
reger-se por uma oração na qual dizem “seja feita a minha vontade assim na
terra como no céu” – , tal programação mental parece um remédio imprescindível
para que as famílias possam dar a devida atenção às crianças.
Conforme as situações concretas surgem, no entanto,
percebe-se que tal valor não funciona. “Por meus filhos eu faço tudo” no campo
do consumo leva famílias a fazerem absurdos sacrifícios para darem presentes
caros a filhos que logo os desprezam, no campo da educação leva pais a fazerem
lições para os filhos, a, por toda a vida, encobrir seus erros para que não
sofram.
Mas é nas situações críticas que tal valor se
mostra mais terrível. O avô de Isabela Nardoni pode ter ajudado seu filho a
limpar as manchas de sangue da neta e forjar a versão levada à polícia, o pai
do rapaz que atropelou o filho de Ciça Guimarães pode ter pensado em ajudar o filho
corrompendo policiais. Emerge, gigantesca, a questão: como ajudar os filhos?
Como populares que, querendo ajudar, pegassem
qualquer balde e jogassem ao fogo, só depois vendo, pela explosão, que jogaram
combustível, para educar filhos é fundamental que os pais olhem para o que tem
dentro de seus próprios baldes, quais são seus valores, sentimentos e
experiências nesse campo.
Nesse esforço, é muito provável que profissionais
dedicados se descubram pais marcados pela culpa por não darem a atenção que
desejariam aos filhos, pelo medo constante causado por um mundo que tem
momentos ameaçadores. Sentimentos poderosos, serão responsáveis por entregar
aos filhos ferramentas pesadas e tortas com as quais, quando adultos, só
conseguirão complicar seus problemas, num novo ciclo de formação de bombeiros
incendiários.
As crianças estão gritando por pais que sejam
capazes de acalmá-las e instrumentalizá-las para o diálogo e para a paz. Cada
adversidade precisa ser pensada não apenas no imediato – quando então os pais
só querem minimizar suas dores -, mas também tendo em vista a autonomização, a
formação não dos consumidores tirânicos e frustrados que geramos hoje, mas de
seres intelectual, emocional e moralmente integrados, a partir do exemplo de
seus próprios pais.
por
Maurício de Araújo Zomignani em Abril de 2013
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