segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

QUEM CUIDA DO CUIDADOR?



Todo início de ano, renovamos nossa esperança numa sociedade de paz, mas com cada vez mais consciência que ela começa com atitudes, que precisam ser analisadas e valorizadas.

O mundo está cheio de predadores. Nos locais de trabalho, vêem apenas os seus próprios interesses. Nas ruas, espalham lixo, crime, depredação. Nos palácios, enganam consumidores, demitem para reduzir custos, desviam dinheiro público. Nas famílias e igrejas consomem recursos, abusam sexualmente. Triste a vida dos admirados felinos que precisam matar para viver, estreita a vida de quem destaca a si mesmo diminuindo os outros. É preciso cuidado para não ser assim.

Mas raros são os cuidadores. Pela profissão seriam professores, bombeiros, policiais, enfermeiros, psicólogos, médicos, advogados, assistentes sociais. Pela função, seriam orientadores, líderes comunitários, religiosos, políticos, promotores, juízes, conselheiros tutelares, avós, pais e mães. Mas nem profissão nem função fazem o cuidador. É preciso atitude e sensibilidade e estas não são prerrogativas de instituições. Felizes são os passarinhos que comem frutas e semeiam caroços, mas as filas dos zoológicos não são para eles.

Cuidadores, em geral, ganham menos, têm pouca estrutura, são desvalorizados pelas instituições. Por sua sensibilidade ou por entrar em contato constantemente com crises, violências e doenças, sofrem desgastes. É comum que profissionais da saúde, educação e assistência social, que as pessoas que a vida coloca em apoio a quem está em crise acabem ficando duras. Tristemente conhecidos são os médicos que atendem sem cumprimentar, sorrir, olhar. Mas há também professores que afirmam saber, no primeiro bimestre, quem vai passar ou não, assim como assistentes sociais que ao olhar um homem de rua afirmam saber se ele “tem jeito”.

A explosão de predadores que vivemos se deve exatamente à falta de cuidadores, mas não só lá fora. Observando em profundidade, cada um de nós é predador e cuidador, todos podemos produzir ou interromper extensas e poderosas cadeias de exploração, negligência e violência, induzindo ou evitando que vítimas acabem por se tornar, conscientemente ou não, violentadores. Se tivesse sido acolhido por pessoas atentas quando, ainda criança, foi abusado por um parente, mesmo um Maníaco do Parque poderia não ter, anos depois, destruído a vida de dezenas de moças e suas famílias.

Podemos fortalecer ou enfraquecer, em nós e no mundo, a corrente da violência que dá tanta audiência para jornais, dá tanto ouvido para fofocas, espalha desânimo, revolta e autocompaixão. Muito mais importantes que as guerras da violência e da audiência, milhares de olhares tristes esperam que mais pessoas aprendam a ouvir, enxergar, que valorizem, em todos os ambientes, as funções, as atitudes acolhedoras, que estimulem carinhosamente o cuidador. A começar por aquele que existe em cada um, que é o primeiro a precisar de cuidado. 
 (1) – Esse desafio é proposto por Adalberto Barreto, criador da Terapia Comunitária, técnica que vem cuidando de milhares de pessoas, a maioria das quais sem acesso a programas de saúde mental.

(Artigo escrito por Maurício de Araújo Zomignani)

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