segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

MUDA CIDADANIA MUDA

Acabo de desligar a tevê. Primeiro vi o programa de uma jornalista econômica e convidados analisando a influência das manifestações na conjuntura econômica. Exercendo meu poder de telespectador, mudei de canal e assisti o filme “O Artista”, voltando depois ao canal de notícias a tempo de pegar uma análise da influência do mesmo fenômeno agora nas eleições presidenciais.
O filme trata da situação de um artista de sucesso no cinema mudo que enfrentou enorme crise com a quebra da bolsa de valores de Nova York, na qual perdeu tudo, e com a mudança da indústria cinematográfica na introdução do cinema falado. Uma mocinha sem maior expressão, a quem ele dera espaço como coadjuvante num de seus filmes, adaptou-se muito bem e tornou-se a estrela do momento, enquanto ele entrou em decadência pessoal e profissional, passando a lutar pela própria sobrevivência.
No momento central do filme a jovem estrela, eufórica com o sucesso, dá entrevista num restaurante. Sem saber que tem na mesa ao lado o artista decadente, responde à pergunta do momento: a que se devem as mudanças? A moça revela achar que as pessoas querem ouvir sua voz e não mais ver os velhos artistas com suas mímicas pobres. Diz que o velho deve dar lugar ao novo finalizando, sem maiores pretensões: “É a vida!”. Ele, então, mostrando-se, lembra-a que foi ele quem lhe deu oportunidade, o que a faz cair em si propondo-se então reergue-lo, o que por fim consegue não com a fala nem com a mudez, mas com a dança.
Nunca em minha vida de telespectador o exercício da tão limitada liberdade fez tanto sentido. Em meio a uma crise econômica e a uma mudança de paradigmas, estava ali colocada a submersão de figuras antigas, a emersão de novas e a relação entre elas na nova realidade. Será que a vida vai imitar a arte? Improvável. Mas o que acontecerá com as figuras políticas que representam o velho sistema político? Quem irá emergir captando a ânsia pelo novo? Como não repetir antigas frustrações como a do ex-presidente aparentemente novo que, embriagado com seu sucesso, mostrou-se pior que todos os velhos? A ex-ministra que emergiu na política velha, mas que pode ser identificada com o novo momento buscará aliança com o velho? A Presidenta, o senador e o governador candidatos conseguirão ouvir e aprender a dançar a nova música?
De que adianta, afinal, poder votar, ou mudar de canal, se as alternativas são ruins? Talvez possamos aprender agora que política é mais do que eleições, mas é também candidatar-se. Mais que assistir velhos ou novos personagens com suas mímicas ultrapassadas, o melhor de tudo será se tivermos pegado gosto por ouvir o som das nossas vozes protestando, propondo, mudando. Se conseguirmos mudar a programação – e as equipes de televisão, tanto quanto os partidos, foram alvos constantes da revolta – como já temos conseguido, precisaremos aprender a assumir o controle, mesmo que remoto, e usar nossa inteligência para fazer conexão entre as imagens, programas e sons para entender e melhorar de verdade a vida.  
  

por Maurício de Araújo Zomignani em Julho de 2013

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