Alegria, por
causa de uma enorme tristeza. É de se festejar o trabalho da Polícia,
Ministério Público e dos jornalistas do Fantástico. A reportagem acompanhou uma
investigação das autoridades e mostrou médicos e dentistas, muitos com elevados
cargos na máquina pública – um deles Secretário do Governo do Estado de São Paulo
– que ganham dinheiro público sem trabalhar. Os profissionais, mostrados em
seus carros caros e consultórios luxuosos foram confrontados com filas enormes de
pessoas muito humildes, que acordam de madrugada para conseguir agendamento
para consultas que demoram cinco meses, e que por fim apresentaram sérias críticas
de descaso e de mau atendimento. É mesmo uma enorme tristeza.
A alegria
corre por conta da denúncia. Pena que não se fez a investigação em outros
hospitais, prontos socorros e unidades básicas de saúde. Quem algo conhece do
serviço público sabe que é comum achar-se médicos e dentistas, entre outros
profissionais liberais, que não cumprem a jornada que realizam em seus diversos
empregos porque ela é simples acúmulo de fontes de renda, impossível de ser
cumprida. E mais: que há fortíssima pressão para que os melhores cargos de
chefia sejam preenchidos por médicos. E ainda mais: que os secretários de saúde
e chefes que exigiram cumprimento de jornada acabaram demitidos.
Profissionais
pragmáticos podem acenar com a baixa remuneração oferecida pelo SUS. Não percebem
eles que quanto mais desvios houver menos recursos se poderá pagar, e o inverso
também é verdade, num círculo vicioso em que afundam todos. Que quanto mais
desmoralizada e desumanizada estiver a saúde, mais difícil será lutar por
melhores salários, e que tudo isso inviabilizará o sistema público de saúde. Profissionais
ambiciosos podem raciocinar que se tivéssemos um sistema de saúde que
funcionasse não haveria clientela para os planos de saúde e consultórios particulares,
sem compreender que há uma enorme demanda não atendida que daria entrada no
sistema se ele funcionasse. Profissionais cínicos diriam que há inúmeras outras
funções extremamente respeitáveis cujos ocupantes também não cumprem sua
jornada de trabalho, especialmente no Legislativo e no Judiciário, no que
estariam corretos, sem perceber que assim igualam suas categorias até aqui tão
respeitadas a outras que têm merecido profundo descrédito por parte da
população.
Mas há
também bons profissionais. Em nome deles, e principalmente em nome das pessoas que
todos os dias voltam para suas casas, ou morrem, por falta de tratamento, vagando
entre um hospital e outro, os Conselhos Profissionais precisam punir os maus
profissionais para evitar a desmoralização completa pela generalização, e os
gestores públicos precisam implantar controles eletrônicos para médicos, dentistas,
parlamentares, juízes, promotores. Só assim toda a sociedade irá se apresentar,
unida, para legitimar a luta dos bons servidores públicos que comparecem aos
locais de trabalho, cumprem sua jornada e prestam atendimento de qualidade,
apesar da baixa remuneração.
por
Maurício de Araújo Zomignani em Junho de 2011
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