segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

RIO: EUFORIA OU ESPERANÇA?

Foi emocionante a esperança da sociedade diante da repressão promovida no Rio de Janeiro junto a favelas e bairros pobres, mas foi lamentável a euforia. Não existem soluções simples para problemas complexos e, como Collor, que afirmou acabar com a inflação com apenas uma bala na agulha e apenas confiscou nossas poupanças, só assim não chegaremos a resultado nenhum.

O crime organizado tem como seu financiador o tráfico, todo mundo sabe. Mas o comércio de drogas, como qualquer outro, não existiria se não houvesse quem produzisse, transformasse, transportasse, distribuísse, vendesse, quem consumisse, é óbvio, nem quem o protegesse com sua ação ou omissão. Como acreditar que se está eliminando um problema tão complexo reprimindo apenas um dos muitos centros de distribuição, combatendo esses soldadinhos esquálidos, doentes, analfabetos e violentíssimos, ou mesmo seus chefinhos de momento?

As drogas deixam em seu caminho um grande contingente de zumbis. Os zumbis excluídos e suicidas são esses milhares de jovens recrutados num segmento da sociedade que possui poucas oportunidades, baixa remuneração e desrespeito a direitos: possuem baixa expectativa de vida porque pouco esperam da vida. No extremo oposto da escala social, temos os zumbis doentes ou, se não dependentes, irresponsáveis, que consomem a droga e financiam toda a rede criminosa. Mas há ainda um terceiro contingente fundamental, os zumbis morais que, tendo informações, condições ou atribuições de combater essa rede, se fazem coniventes e protetores ativos de toda essa hecatombe humana.

Mesmo possuindo dentro de si o universal instinto de vida, os soldadinhos do tráfico optam pela morte que, todos sabem, é a contrapartida do dinheiro imediato e do poder social que adquire quem ingressa nesse caminho. Mas, no imenso segmento do qual se originam, eles são insignificante minoria. Os consumidores de drogas da classe média e alta, mesmo possuindo sólidas condições materiais e oportunidades abertas, optam pela morte que, todos sabem, é o efeito colateral do prazer alcançado pelas drogas. No ainda restrito grupo social dos incluídos, no entanto, a massa dos consumidores de drogas não é tão minoritária assim. Os protetores do crime, desde os anti-cidadãos que não denunciam até aqueles que, sendo pagos para reprimir, investigar, julgar, optam pelo resultado imediato, egoísta, fazem-se terrível agravante do problema que deveriam solucionar. E a sensação que se tem é que, em algumas regiões e instituições, eles são contingente considerável.

Por isso tudo, a euforia não se justifica, mas a esperança sim. Se virmos essa ação articulada de instituições dos três poderes como uma solução, teremos mais algumas décadas de lamentação. Mas se continuarmos denunciando, exigirmos que as ações continuem e abranjam também a exclusão social que fornece os soldadinhos, o consumo que mata e financia, bem como, severamente, a estrutura política e estatal conivente, nós poderemos ter, e só a partir daí, um divisor de águas não apenas para a questão da violência, mas para a formação de um país. 

por Maurício de Araújo Zomignani em dezembro de 2010

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