A questão, feita ao maior responsável pelos valores das
sociedades ocidentais, teve outra resposta. Disse aquele homem que, acima de
tudo, colocássemos o amor ao que é absolutamente certo, soberanamente justo,
perfeitamente bom, situando como consequência natural o amor à porção dessa
perfeição máxima que um dia reconheceremos no próximo e em nós mesmos, frutos
que somos da mesma árvore, portanto integrantes de uma mesma espécie. Filho de
peixe peixinho é e nós, aprendizes de pescadores de essências, deveremos ser
capazes de jogar nossas redes novamente e sempre. Com esperança e fidelidade,
orienta-nos o professor, a colheita será farta.
A pergunta também foi feita à atriz. Não pela casuística do
mundo que exige uma hierarquia de valores para julgar os casos dos indivíduos,
não pela astúcia dos homens que montam ciladas à luz para que ela não revele suas
sombras. A pergunta lhe foi feita pela doença. Inquirida pela ausência de sua
mãe e pela falta que dela sentiu, pelos filhos que não queria que sentissem,
questionada pela própria morte, a atriz optou por ambos: pela vida e pelo amor.
No início mais modelo que atriz, ultimamente mais atriz que
modelo, com a resposta a atriz passou a ser modelo. Mais modelo que ao pregar a
proteção dos refugiados por todo o mundo, mais modelo que ao realizar a
proteção dos refugiados em sua própria família. Ali, ela foi modelo como nunca.
Discute-se agora detalhes da cirurgia e também se era a
melhor terapêutica. Com todo respeito, pouco importa. O real torna-se
insignificante quando o simbólico é eminente. Uma mãe que se amputa como
declaração de amor aos filhos, indiretamente à sua própria mãe – e também a
outras mulheres com alto risco de câncer – , como declaração de amor à vida,
não pode ser reduzida a esses detalhes.
Todos nós temos valores. Um hipotético ser destituído de
valores seria tão apagado e inútil quanto um computador que não dispusesse de
qualquer programa dentro dele. Estaria morto, mesmo que aparentemente aceso. Assim
como serão os programas que darão utilidade a um computador, serão os valores
que permitirão a uma criatura avaliar, decidir, pensar. Logo, existir. Esteja alerta.
Até porque a cada um de nós a vida fez ou fará a mesma
questão. Outro será o contexto, diversos serão os detalhes, mas todos
enfrentaremos decisões delicadíssimas, difíceis. Preste atenção à lição dada
pela vida, numa parábola real tão vigorosa como esta, tão inesquecível quanto
as outras: em algum momento você também, de alguma forma, será levado a
escolher entre sua vaidade, sua identidade, seu próprio corpo, ou a vida e o
amor. Esteja preparado.
Talvez também seja preciso cortar na própria carne.
por
Maurício de Araújo Zomignani em Maio de 2013
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