segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

TRAGÉDIAS PATERNAS

Um homem comum, quieto, profissional exemplar tem membros de sua família assassinados por pessoa identificada com atividade perniciosa à sociedade. Com uma dor superlativa, diante da ineficácia dos órgãos oficiais, toma a justiça nas próprias mãos, arma-se, e vai ao local onde se presume que esteja o assassino. Lá, descobre a existência de outros representantes do mal e vai procedendo a implacável limpeza até que, ao final, em encontro pessoal com o criminoso, em condições tremendamente adversas ao vingador, obtém inquestionável vitória. Quem já não viu esse filme?

Outubro de 2009, Curitiba, Paraná. Um rapaz de 27 anos de idade, filho de um ex-comandante dos bombeiros, é morto com dois tiros numa tentativa de assalto por duas pessoas que estariam drogadas. Chega-se a prender dois suspeitos da morte do rapaz, mas acabam sendo soltos por falta de provas. Nas semanas seguintes, diversos assassinatos de usuários de drogas ocorrem na região. Nenhuma das vítimas tem relação com o ocorrido. Um delas sobrevive e atribui a autoria do assassinato ao coronel , o pai do jovem assassinado. A notícia não informa, mas o pai deve ter inúmeros serviços relevantes prestados à comunidade. Ainda mais por servir em uma corporação reconhecida pela população cujos membros arriscam a vida em para salvar a vida de estranhos.

Também nada se diz sobre isso, mas o rapaz de 27 anos morto barbaramente quando levava a namorada para casa deveria demonstrar aspectos de bom filho, um futuro enorme pela frente. Para os pais que um dia o retiveram nos braços, velaram noites a fio, em que pesem os equívocos de todo jovem, seus filhos sempre serão afetivos, inteligentes, promissores.  Mas não houve futuro.  As promessas que sua vida sugeriam não foram cumpridas, sua inteligência e seu afeto foram estancados.

Nos filmes, o vingador não erra. Não existe processo legal, direito de defesa, a necessidade de respeitar instituições mas, como um deus ele sempre faz justiça. Não se levanta a possibilidade de algum dos assassinados pelo vingador não ter cometido crime, possuir família, ter um pai o qual, pela lógica da vingança, também teria direito de tomar uma arma e sair matando, numa progressão geométrica e infinita que reduziria a justiça, a humanidade, a própria vida das pessoas, a uma simples questão de possuir maior ou menor habilidade e potência de fogo.

Os filmes e as manifestações culturais, a televisão e os meios de comunicação, no entanto, não podem transformar em padrão essa forma de ser pai e de alcançar justiça. Aqui estamos refletindo sobre a tragédia, mas não iremos longe. Apenas lembraremos outra forma de ser pai, dos pais que choram por filhos drogados, alguns mortos. Ainda mais porque, são pais que um dia os retiveram nos braços, velaram noites a fio. Em que pesem os equívocos de todo jovem, seus filhos também eram afetivos, inteligentes, promissores.  Porque também para eles não houve futuro algum. As promessas que suas vidas sugeriam não foram cumpridas, suas inteligências e seus afetos foram estancados.

por Maurício de Araújo Zomignani em janeiro de 2011

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