Muito usada é a imagem do vôo
dos gansos para falar do trabalho em equipe. Ali vemos que, voando em “v”,
alcançam distâncias setenta por cento maiores do que se voassem sozinhos, que aquele
que está à frente é o que se sacrifica pelo grupo e que os que estão atrás grasnam
para incentivá-lo até que ele se canse e passe para trás. Tal figura é ótima
para explicar jogo de equipe no ciclismo, natação, pedestrianismo, e também
pode ser útil no futebol.
Chama a atenção, em diversos
campos sociais, nossa mania de criar ídolos como seres especiais, no futebol chamados
“craques”, prática que endeusa e cobra demais de jogadores às vezes muito
jovens. Esse erro os gansos não cometem. Caso algum deles, mais forte, fique
mais tempo na posição de maior sacrifício, receberá por mais tempo o incentivo
dos demais, mas depois irá, invariavelmente, para trás grasnar por quem se
sacrificar.
Apesar da idolatria, o
futebol e a vida continuam a ser fruto do trabalho em equipe. Se a vida é curta
para quem a vê na perspectiva da eternidade, a carreira esportiva é mais curta
ainda, e um jogador de futebol ampliará muito seu raio de vôo se souber estar
na frente e atrás, receber o incentivo e incentivar, sem absolutizar seus bons
momentos como tentam fazer imprensa e torcedores.
Ganso é também um jogador de
futebol muito bom. Garoto ainda, veio do Pará a Santos tendo como marca
principal a humildade, atitude central para trabalhar em equipe, essencial
mesmo para quem deseja aprender algo na vida. Mas, desde então, o garoto ouviu
muito elogio.
O elogio, para os comuns, é
um evento raro que deve ser lembrado nos momentos tristes para que não nos
deixemos levar pela crítica, pela tristeza, que é o que as pessoas mais recebem
na vida. Para as “celebridades” – palavra que, é bom perceber, não atesta
qualidade alguma, exceto a notoriedade – o elogio é constante, e o que a pessoa
precisa lembrar é da crítica, que será buscada com tremenda intensidade, para
fazer espetáculo do acontecimento mais corriqueiro. Isso faz com que a vida do ídolo
– e também das multidões que se amoldam por esses modelos – torne-se uma
montanha russa de altos muito altos e baixos muito baixos. Não é à toa que a
doença de nossos tempos é o transtorno bipolar.
O vôo do Ganso é inevitável.
Foi-se o tempo em que o jogador ficava num mesmo time por toda a carreira. Hoje
em dia é aceitável que ele busque melhores condições como qualquer profissional.
Mas quem vive no futebol precisa entender que aquele que joga para o dinheiro,
num terreno tão marcado pela paixão, acabará marcado como mercenário, um pássaro
que quer voar sozinho. Robinho, do alto de seus muitos sucessos e equívocos –
saiu forçado de todos os clubes que defendeu – fez muito bem ao lembrar isso ao
menino.
Que o Ganso voe alto e voe
por muito tempo. Para isso, Ganso, o craque, teria que aprender com a história
do ganso animal, pois a atitude tem sido fator central para limitar carreiras
promissoras em todos os campos. Talvez precisasse também estudar outra
história, a de Ícaro.
por Maurício de Araújo Zomignani em Abril de 2011
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